domingo, 22 de maio de 2011

Gálatas – Introdução

Como falamos, passamos a estudar a carta de Paulo aos Gálatas.

Neste post e no próximo colocarei alguns trechos extraídos do verbete “Galatians, Epistle to the”, do Anchor Bible Dictionary (v. 2, p. 872-875), um dos melhores e mais atualizados dicionários bíblicos. Com o complemento de que o autor do verbete, Hans Dieter Betz, é um especialista na carta paulina. O objetivo é dar um pontapé inicial para nossas discussões, lembrando que as citações abaixo não implicam em total concordância com seus conteúdos.

Embora não estejam entre aspas, os parágrafos abaixo são tradução do referido dicionário.

Destinatários

A carta é endereçada às “igrejas da Galácia” (1.2; cf. 3.1). A localização da região denominada Galácia tem sido extensivamente discutida, mas sem resultados definitivos. A localização mais provável é a Anatólia Central, onde tribos de celtas nômades se assentaram após 278/277 a.C. (a “Galácia do Norte” ou “hipótese territorial”). Menos provável é a “Galácia do Sul” ou “hipótese da província”, que supõe que Paulo está se referindo à Província Gálata, estabelecida por Roma em 25 a.C. Tal província incluiria a Galácia bem como algumas áreas ao sul (Pisídia, Licaônia e Panfília) que podem ser conectadas à primeira viagem missionária de Paulo, segundo Atos 13-14. Mesmo assim, as informações apresentadas por Gálatas e Atos não podem ser harmonizadas. At 13-14 não menciona a Galácia. Em 16.6 e 18.23 a “província da Galácia” é mencionada, mas nenhuma missão é descrita. Do mesmo modo, os habitantes da Pisídia e Licaônia não eram chamados de gálatas. Se os itinerários descritos em Atos são historicamente confiáveis, relatando de modo detalhado todas as viagens de Paulo, isso é um problema sem solução. Embora nenhum traço arqueológico tenha sido deixado, a Anatólia Central é a localização mais provável para as igrejas da Galácia (cf. Betz, Galatians, Hermeneia 1-5).

Data e lugar de origem

A carta aos Gálatas pode ser datada apenas aproximadamente, uma vez que não existem evidências concretas. Os pesquisadores argumentam tanto em favor de uma data mais remota quanto de uma mais recente em relação com outras cartas. Teologicamente, Gálatas reflete uma posição mais próxima de 1 Tessalonicenses, enquanto Romanos, a última grande carta paulina, apresenta uma revisão de pontos importantes de Gálatas. Portanto, uma data remota é mais provável.

A carta não apresenta pistas a respeito do lugar de origem. O Prólogo Marcionita (para esse texto cf. Harnack 1924: 127-128) afirma que ela foi remetida de Éfeso, mas o subscripto que consta em alguns manuscritos de Gálatas indica Roma como o lugar do qual ela foi enviada. Os pesquisadores têm argumentado em favor de Éfeso, Macedônia e Coríntio, mas tais indicações não são mais do que meras possibilidades.

Gálatas como um documento histórico – A história da Igreja Primitiva

Informações relativas à história da Igreja Primitiva são comparativamente ricas, embora extremamente breves. Como a missão se espandiu para a Palestina e a Síria muito cedo, não havia, aparentemente, regulamentações concernentes a áreas ou a identidades éticas. Surgiram oposições contra a prática de fazer convertidos entre os gentios sem sujeitá-los à Torá e à circuncisão. Esta disputa gerou a Conferência de Jerusalém (2.1-10), onde três partidos se apresentaram: Paulo, Barnabé e Tito, como delegados da missão gentílica; Tiago, Cefas e João, como os “pilares” da igreja de Jerusalém (2.9); e a oposição anti-paulina, chamada de “falsos irmãos” (2.4). O último grupo exigia a circuncisão e a obediência da Torá aos gentios bem como aos judeus cristãos. Os dois grupos primeiros concordavam entre si, em detrimento do último. O gentio Tito participou da conferência e retornou incircunciso (2.3).

Em Gl 2.7-9 Paulo apresenta os pontos de concordância a que chegou a conferência. Foi reconhecido um Deus e uma igreja, mas a missão foi dividida em duas. Cefas assumiu o “apostolado da circuncisão”, enquanto Paulo foi reconhecido como o líder da missão aos gentios. Como gratidão (2 Co 9.6-15; Rm 15.27), o apóstolo promoveu uma coleta para levantar fundos aos pobres da igreja de Jerusalém (2.10).

O episódio final apresenta o conflito entre Paulo e Cefas em Antioquia (2.11-14). O que estava em discussão era se judeus cristãos poderiam ter comunhão à mesa com cristãos gentílicos sem que violassem suas leis de pureza (koinophagia, “consumo de alimentos impuros”). A questão era: o que é mais importante, a comunhão cristã ou as leis de pureza judaicas? Paulo assumiu o lado dos cristãos gentios, defendendo suas posições a respeito da fé e da salvação; mas Cefas, Barnabé e outros foram persuadidos a se retirar pelos “homens mandados por Tiago”. A disputa não foi resolvida, resultando na separação de Paulo dos outros cristãos judeus presentes; um resultado futuro foi a crise na Galácia que gerou a carta de Paulo.

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