sexta-feira, 9 de abril de 2010

Uma resposta não-programada

Postei um comentário mais longo sobre Gn 22, abordando o que considero ser o tema principal do relato - a fidelidade. Cheguei a essa conclusão há algum tempo e toda vez que releio o texto imagino que estou num bom caminho de interpretação, caminho que me deixa algo angustiado, embora feliz, por que levanta interessantes questionamentos para a experiência e o discurso teológico protestante-evangélico do qual participo.
Esse post estava pronto antes do Paulo escrever sobre o humor e o Leonel responder com Kierkegaard, mas no final das contas, sem programação prévia, é um post que conversa com os outros dois.
No tema da fidelidade de Elohim-YHWH em Gn 22 também encontro os dois elementos presentes na postagem do Paulo: terror e humor (o primeiro deles certamente aparece em Kierkeggard com seu Temor e Tremor, o segundo também está lá, talvez menos visível, mas não menos risível no Isaque desmamado). Não há como fugir do escândalo proposto pelo texto bíblico: Elohim-YHWH diz a Abraão para sacrificar seu filho. Mesmo que não tenha deixado que Abraão o fizesse, a ordem por si só é assustadora. E, mais tarde, pela leitura cristã, o que Elohim-YHWH não permitiu a Abraão que fizesse, ele mesmo o fez entregando seu unigênito à morte. Terror só se enfrenta adequadamente com humor e humor só encontra seu limite diante do terror - não será por isto que tragédia e comédia sejam gêneros gêmeos?
Olho para Kierkegaard. Luterano imprevisível, o texto dele citado já tematizava a fidelidade, mas sob o manto da "fé". Fé, principalmente por causa de Lutero e da Reforma, tornou-se uma obsessão protestante-evangélica. Obsessão tão intensa que se tornou um termo vazio para descrever um sem-fim de experiências religiosas díspares (já Bonhoeffer no século passado, em meio ao terror do nazismo, refletia sobre o sem-sentido da "fé"). A fé, conforme se pode perceber no discurso devocional protestante-evangélico, é um ato pontual e intermitente: a gente tem fé na hora da conversão, depois tem fé na hora da santificação, ou na hora do batismo com o Espírito, depois tem fé na hora do avivamento, mais tarde tem fé na hora de conseguir uma resposta para a oração, etc. até, ao final do percurso (para alguns pelo menos), ter uma fezinha para ganhar uam graninha. Fé não é fé em Gn 22, é fidelidade, que é uma paixão de outro tipo: não é pontual ou intermitente, é durativa e constante em todos os seus altos e baixos. Parece-me que é nesta direção que o texto kierkegaardiano citado nos leva a olhar. Mesma direção que outros dois textos sugeriram em uma instigante conversa que ficou truncada pela obsessão com a fé - não é verdade que "o justo se torna justo por sua fidelidade"?

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